— Alô?
Quem tá falando?
— Aqui é o ladrão.
— Desculpe, a telefonista deve
ter se enganado, eu não queria falar com o dono do banco. Tem algum funcionário
aí?
— Não, os funcionário tá tudo
refém.
— Há, eu entendo. Afinal, eles
trabalham quatorze horas por dia, ganham um salário ridículo, vivem levando
esporro, mas não pedem demissão porque não encontram outro emprego, né? Vida
difícil... mas será que eu não poderia dar uma palavrinha com um deles?
— Impossível. Eles tá tudo
amordaçado.
— Foi o que pensei. Gestão
moderna, né? Se fizerem qualquer crítica, vão pro olho da rua. Não haverá,
então, algum chefe por aí?
— Claro que não mermão. Quanta
inguinorânça! O chefe tá na cadeia, que é o lugar mais seguro pra se comandar
assalto!
— Bom... Sabe o que que é? Eu
tenho uma conta...
— Tamo levando tudo, ô bacana. O
saldo da tua conta é zero!
— Não, isso eu já sabia. Eu sou
professor! O que eu queria mesmo era uma informação sobre juro.
— Companheiro, eu sou um ladrão
pé-de-chinelo. Meu negócio é pequeno. Assalto a banco, vez ou outra um sequestro. Pra saber de juro é melhor tu ligá pra Brasília.
— Sei, sei. O senhor ta na
informalidade, né? Também, com o preço que tão cobrando por um voto hoje em
dia... mas, será que não podia fazer um favor pra mim? É que eu atrasei o
pagamento do cartão e queria saber quanto vou pagar de taxa.
— Tu tá pensando que eu tô
brincando? Isso é um assalto!
— Longe de mim pensar que o
senhor está de brincadeira! Que é um assalto eu sei perfeitamente; ninguém no
mundo cobra os juros que cobram no Brasil. Mas queria saber o número preciso:
seis por cento, sete por cento?
— Eu acho que tu não tá
entendendo, ô mané. Sou assaltante. Trabalho na base da intimidação e da
chantagem, saca?
— Ah, já tava esperando. Você vai
querer vender um seguro de vida ou um título de capitalização, né?
— Não...já falei...eu sou...
Peraí bacana... hoje eu tô bonzinho e vou quebrar o teu galho.
(um minuto depois)
— Alô? O sujeito aqui tá dizendo
que é oito por cento ao mês.
— Puxa, que incrível!
— Incrive por que? Tu achava que
era menos?
— Não, achava que era mais ou
menos isso mesmo. Tô impressionado é que, pela primeira vez na vida, eu
consegui obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço pelo
telefone em menos de meia hora e sem ouvir 'Pour Elise'.
— Quer saber? Fui com a tua cara.
Acabei de dar umas bordoadas no gerente e ele falou que vai te dar um desconto.
Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado?
— Não acredito! E eu não vou ter
que comprar nenhum produto do banco?
— Nadica de nada, já ta tudo
acertado!
— Muito obrigado, meu senhor.
Nunca fui tratado dessa...
(De repente, ouvem-se tiros,
gritos)
— Ih, sujou! Puliça!
— Polícia? Que polícia? Alô? Alô?
(sinal de ocupado)
— Droga! Maldito Estado: quando o
negócio começa a funcionar, entra o Governo e estraga tudo!
Luis Fernando Veríssimo
Atividades
01) Sobre a linguagem utilizada nesse trecho, é correto
afirmar:
a- Foi utilizado o nível
de linguagem culto, com vocabulário rico.
b- A linguagem utilizada
pelos assaltantes pode ser considerada adequada ao contexto
c- O conteúdo e o
vocabulário da linguagem dos assaltantes não está de acordo com os níveis de
linguagem empregados.
d- A linguagem utilizada
pelos assaltantes pode ser considerada inadequada porque é coloquial
02) A expressão “Tu traz o berro que nóis vemo rendê o
caixa bonitinho”, poderia ser substituída, sem mudar o sentido, em linguagem
formal, por:
a) Me traga o revólver que
nós vamos dominar facilmente o caixa.
b) Tu trazes o revólver
que vais dominar o caixa.
c) Traga-me o revólver que
vamos dominar de maneira bela o caixa.
d) Traga o revólver que
vamos dominar facilmente o caixa.